Category Archives: blog

O inferno é o outro, Lycopodium clavulatum

“O inferno é o outro…”

É muito comum ao analisar uma pessoa doente nos focarmos nos seus sofrimentos desenvolvendo uma compaixão que ajuda a terapêutica, mas, algumas vezes, não nos deixa perceber aquela pessoa, diante de uma situação de menor fragilidade.

Uma moça, sentada e chorando debaixo de uma árvore antiga e frondosa, buscava refrescar a sua alma na única sombra daquela vastidão arenosa. Foi quando entre um soluçar e outro, perguntou para si própria:

– Por quê sou gorda?
Uma voz respondeu:
– Porque você come demais!
Assustada, retrucou:

– Quem está falando? Socorro!

– Larga de ser boba mulher, que estou muito velho para brincar de pique-esconde.

– É você, senhor?! Me desculpe, mas nunca conversei com um carvalho antes…

– Também nunca sentou aí embaixo ninguém que eu não conseguisse cobrir totalmente com minha sombra.

– É, tá querendo dizer que eu sou gorda mesmo.

– Snif, snif! Não fale assim, pois não fica bem para uma árvore milenar como eu, começar a chorar.

– Árvore não chora.

– Quem disse isso a você, além de pesada é ignorante.

– Tá bom, desculpa.

– Oh, garota! Olhe pra cima. Está vendo este monte de frutas aqui dependuradas.

– Não… Espere, tem uma lá em cima, mas está muito alta.

– É isso aí, toda vez que alguém me conta uma história triste, cai uma fruta… Elas são as minhas lágrimas, sua idiota.

– Pode xingar, eu sei que sou isso mesmo, é igualzinho quando a Marta começa a brigar com as meninas.

– Lá vem este papo outra vez de “minha chefe é isso, minha chefe é aquilo…”

– Que minha chefe o quê, a Marta é minha funcionária.

– Funcionária? Então a demita, ora bolas…

– Demitir a amante do dono da empresa, se bobear ela é que me puxa o tapete. Pensava que era amiga dela, mas agora vejo que tenho é medo de sua arrogância.

– Hum! E o que tem haver a comilança com isso?

– Tem que para melhorar o clima entre as meninas, compro pão de queijo, deixo em cima da mesa para que todas possam comer e quando percebo, comi tudo sozinha…

– Ah, Ah, Ah!, mas é uma imbecil mesmo.

– Imbecil é você, seu carvalho de meia tigela, velho e solitário, tomara que um raio caia em sua cabeça.

Foi quando de repente viu-se uma luz cair do céu e espatifar o carvalho em mil pedaços. Ao observar os restos do carvalho, a moça percebeu que tinha se transformado em uma planta rala e rasteira, um Lycophodium. Sem que tivesse tempo para levantar a cabeça, a fruta que outrora se escondia no carvalho, caiu em suas mãos. Como num piscar de olhos a garota comeu a fruta que deliciosamente abateu sua fome e sua sede. Mas qual não foi sua surpresa, ao chegar na semente de formato esquisito, que parecia se mexer. Ficou então, ali posicionada, olhando-a embevecidamente e bem no centro da semente ali estava sorridentemente brincando de roda: ela, o carvalho e a Marta…

Inferno é um lugar tão escondido quanto a semente do carvalho, que guarda segredos de nós mesmos, contidos em nosso subconsciente. Procuramos nos acolher, como no carvalho, sob aquilo que nos parece comum e não nos ameaça. E somos vítimas da arma que carregamos conosco.Na verdade a garota, o carvalho, o Lycophodium e a Marta são a mesma pessoa, em momentos diferentes, alimentando-se da arrogância – o fruto do carvalho. Apesar de utilizar o poder de subjugar o outro, o desejo essencial dos sujeitos é a segurança, manifesta quando “ela”, num momento de fragilidade, senta-se à sombra dela mesma, o carvalho. E revela-se ao sofrer as chacotas da árvore maldita, que sequer a refrescava – só parecia frondosa – ameaçando-a com seus próprios medos, até vê-la se transformar naquilo que ela é: uma planta rala e rasteira.
Para fazermos um diagnóstico e ajudar estas pessoas corretamente, é necessário olharmos para o contexto em que elas estão inseridas, os relacionamentos que têm, de que sofrem e como reagem às farpas que, quotidianamente, são atiradas ao leu e as procuramos desatentamente por parecer um carvalho frondoso e refrescante.

Poder: arrogância, desejo: segurança pela autoridade, medicamento: Lycopodium

Germinando

Os germes “modernos” são o abandono, a tristeza, a frustração, a menos valia, a indignação, a injustiça, a desconfiança, o ódio. E, como já vimos, contaminam não pelo ar, mas pelo olhar, através de maus relacionamentos. E o que é um relacionamento mal estruturado? É aquele que atende basicamente mais um indivíduo que outro. E por que são estruturados desta forma? Para que haja uma estrutura desta natureza, é necessário que se dê diferentes pesos aos objetos do desejo. Dinheiro e poder valem mais que tempo e trabalho – inversão de valores – o resultado é mais importante que os meios para consegui-los. Comida virou ponto de referência para extração de energia na sociedade urbana, esquecendo-nos que os relacionamentos também são geradores de energia. Alguns valores urbanos como a solidariedade, são esquecidos, talvez por uma estrutura de transportes, médica e educacional farta. Valores são perseguidos por nós incondicionalmente, sem que observemos nossos verdadeiros desejos. Sofremos todos, poderosos e oprimidos, possuidores e despossuidores. Carregarmos o peso de grandes decisões, adoecermos pelo esforço, desenvolvendo estados de fadiga absoluta, de ansiedade, de câimbras, de sudorese profusa, sem conseguirmos, nem mesmo, manter nossa concentração no trabalho. Obesos que não conseguem reter energia pelo afeto, com uma demanda excessiva, buscam incansavelmente fontes de energia em seus relacionamentos, até esgotarem o amor do outro.

Sentimentos transformam-se em doença crônica, encapsulados numa redoma, sem germinar. Sem serem exercitados no dia-a-dia ou esgotados até o último suspiro, desenvolvem uma atmosfera que apodrece ao longo do tempo, dando espaço para o surgimento de moléstias que agridem o próprio corpo.

Contágio

Diante das calamidades públicas, com morte de quase dois terços da civilização humana até meados do século XIX, os estudiosos da época encontravam naquele ambiente a essência para o estudo do homem. Uma das muitas perguntas que se faziam na época era por que determinadas doenças acometiam uns e não outros. A resposta veio ao longo dos anos seguintes por diversos canais. Através das descobertas dos microorganismos e vetores (mosquitos) como agentes transmissores de doenças, pareceu-nos em determinado momento que havíamos solucionado as causas das moléstias epidêmicas e endêmicas que acometiam o homem.

No que pese a enorme contribuição social que os processos de higienização trouxeram para a sobrevida humana, temos nos deparado freqüentemente na clínica, com doenças endêmicas, multicausais, que assolam a sociedade ocidental com problemas limitados de saúde. A globalização tem evidenciado este problema, tornando refém dessas moléstias as civilizações que mais espetacularmente vivenciam esta cultura. Dentre elas, a americana e a nossa civilização urbana. A obesidade, a ansiedade, a depressão e a criminalidade são exemplos óbvios e atuais desse processo de adoecer e contra os quais temos tido grande insucesso. As ferramentas clássicas de que dispomos são ineficientes ou incompatíveis com qualidade de vida.

O século XVIII, o último antes da revolução microbiana, esmerou–se na identificação de processos patológicos de causa “imaterial” e foi muito feliz em estabelecer nexo entre doenças e sentimentos. Abandono, medo, tristeza e ódio são exemplos de sentimentos encistados em nossa sociedade “moderna” e que identificamos na gênese de doenças, como nas mencionadas anteriormente. Quando vivenciados como uma “semente vegetal, capaz de reter sua capacidade de germinar, durante longos períodos de tempo”, são capazes de se transformar em patologias identificadas pelo médico comum e pela sociedade.

No dicionário de língua portuguesa também se define como doente aquele que sofre de mal moral. E moral é um conjunto de regras de conduta consideradas como válidas, quer de modo absoluto para qualquer tempo ou lugar, quer para grupo ou pessoa determinada, relativo ao domínio espiritual (em oposição ao físico ou material). A dor, dentro deste contexto, advém da ausência de reciprocidade dos nossos sentimentos, com os sentimentos alheios e com o ressentimento, e da idéia de que o outro tem interesse oposto ao seu. A inveja e a ira reconhecidamente os piores sentimentos perceptíveis no ser humano, tidos como pecados capitais, recheiam um universo de relações que caracterizam o contágio.

Esta transmissão se dá pessoa a pessoa pela comunicação entre elas, nos ambientes de trabalho, de família, em grupos de amigos, reuniões sociais etc., roubando a força de organização de saúde dos indivíduos sensibilizados, contaminando-os. Logo, a mecânica terapêutica pode ser mais abrangente que as restritas consultas individuais e tem de contemplar o grupo, medicando-o uniformemente, após a identificação da cultura perversa instalada. É vasta, hoje em dia, a disponibilidade no mercado de remédios da fauna, da flora, dos minerais e dos metais que, usados em doses mínimas, segundo uma experimentação prévia, são capazes de fazer germinar a “semente” encistada dentro de nós, autentificando as relações, diminuindo as doenças e melhorando a produtividade dos grupos, das empresas e da sociedade.

Pérola, Calcárea carbônica

Disse uma ostra para uma outra visinha:

– Sinto grande dor dentro de mim! É algo pesado e redondo que me deixa deprimida…

A outra sorridente agradecia ao céu e o mar por estar sã e em completa comunhão com a natureza. Foi quando passou um caranguejo que ao ouvir a conversa falou:

– Sim você está boa e sã, mas a dor que sua colega tem, é uma pérola de excessiva beleza…

Uma pérola é um templo construído pela dor em torno de um grão de areia. Todo bom e grande homem que conheci, tinha alguma coisa pequena em sua formação, que o incomodava, mas ao mesmo tempo o impedia da inatividade, loucura ou suicídio. Assim como as tartarugas medindo cada passo de suas vidas, essas pessoas, conheciam melhor a estrada que os velozes coelhos. Porém quando adoecem essas características se transformam em lentidão, fragilidade, deficiência nutricional, mesmo que obesas e quando suas idéias não conseguem se transformar em realidade ficam obsessivos:

– Não consigo pegar um copo d´água que fico com minhas pernas doces…

– Acho que estou ficando louco, há um medo que me possui…
Enquanto suava na cabeça, Pedro dizia sentir um frio que se configurava em suas mãos e pés gelados. Desejava se sentir tão seguro que decidiu trabalhar um tempo como carcereiro voluntário em um presídio e perguntado do porquê de tal atitude, respondeu:

– Lá eu sei o que fazer para que nada me aconteça… É diferente de você estar na rua se escondendo atrás de uma bala perdida, que pode te achar…

Obstinado, sofria pelo poder do inusitado, da surpresa, daquilo que o movimento das marés podem nos trazer que não esperamos. E no seu caso esperava sempre algo ruim. Desejava controlar seu futuro e a cada dia que passava se dedicava mais aos negócios. Precavido em demasia já havia tomado um “sem número” de remédios e chegou absolutamente indiferente quando do falecimento de seu filho, que relatava como se fossem coisas da vida…

– Tudo bem, Deus quis assim…

Lembro-me depois de iniciado o tratamento, que queixava-se de piora geral, lembranças do seu pequeno o faziam chorar:

– Minha gota que já havia sarado voltou…

– No outro dia acordei com uma batedeira no peito danada, fui até ao cardiologista, mas ele disse que não era nada os exames estavam todos normais…

– Dr não tenho nem mais vontade de ficar trabalhando, o que é que vai ser de mim…

Ao contrário do que Pedro poderia pensar, o fato de estar sentindo novamente era um sinal flagrante de melhora, estava reconstituindo seus nervos, sua sensibilidade. O que pretendia certamente era também controla-los, mas isto sem dúvida não é saúde.
A fé dele foi fundamental para persistir no tratamento, pois aos poucos suas preocupações com o futuro foram sumindo, sua atenção ao presente aumentando, o prazer pelas pequenas coisas retornando até perceber que já não mais carregava aquela concha, um fardo certamente maior que a proteção que ela mesma poderia lhe dar.

Poder: surpresa; desejo: saúde e bem-estar; medicamento: Calcária carbônica.

Fluxo, Phosphorus

Estamos subindo para o cume de nossos desejos e se algum alpinista roubar sua comida e sua bolsa e ficar gordo e pesado. Será digno de pena. Pois a subida do ladrão ficará mais árdua e o fardo tornará mais longo o seu caminho. Assim enxerga a vida, Maria, que só tem energia para a doação, o trabalho voluntário e a compaixão:

– Dr… A gente dá com a mão direita que é para a esquerda não cobrar…

– …Quem faz gratidão não espera recompensa…

Veterinária, “mãezona” de um pastor alemão, três Pudows toy e cinco gatos, respondeu-me quando lhe perguntei o que pretendia com tamanha dedicação.

– Ainda cuido de minha mãe que está doente…

É como se tivesse uma nascente dentro de si, escoando sua produção para os oceanos. Ou como o “ladrão” de uma pia, drenando a água que precisa estar constantemente sendo ejetada, para que não esvazie o compartimento.

– Não tenho marido mesmo…

– Minha maior alegria é quando meu gato sobe em meu colo para que eu possa acaricia-lo.

Esqueceu-se de sua vida pessoal, pois em algum momento, agora como foz e não mais como nascente no rio de sua vida, caiu sob o poder do desamparo e egoísmo. Perdeu seu noivo num acidente, a véspera de seu casamento. Busca afeto com a habilidade de suportar e amparar.

– Não posso nem focar muito um estranho que começo a ver coisas…

Como se sua consciência fosse a existência alheia. Como se os reflexos de um espelho ofuscassem a visão de si:

– A luz me dá dor de cabeça e minha fraqueza me faz comer.

Sente e sofre com medo de tudo, sendo muito susceptível a energias de todo tipo:

– Adoro receber uma massagem…

– Se estiver num lugar que não me sinta bem… Naquele mês, mênstruo sem parar…

– Tenho até que fazer meu crochê ou me dedicar mais a minhas aulas de canto…

A cura de Maria aflorou quando aprendeu através das artes, que a beleza alivia a dor. Atenua a frustração. E organiza as emoções. Pois como nascente sobe, como cachoeira desce, sem coordenação, apenas pela necessidade de fluir nas relações em busca de afeto.

Poder: doação e da solidão; desejo: cuidar e de energia; medicamento: Phosphorus.

Missão Espiritual, Arsênicum album

– A senhora é brava?

– Ah… De vez em quando eu agito…

– Agita com o que?

– Eu vivo abusada da minha felicidade!… Nunca apanhei dos meus pais, vou apanhar de qualquer coisa…

– Que coisa?

– Do velho que tem lá em casa…

– Seu marido?

– É, essa coisa aí…

Dona Juraci chegou com “queimações” por todo o corpo, problemas de saúde e continuava a falar:

– Eu gosto das coisas de acordo e limpas, se não tá bom eu falo mesmo e acho que é isso que incomoda aquele “bebum”…

Seu dom era o da sobrevivência, seu desejo o da correção e o poder que lhe afligia, o da ameaça de vida. Vindo de uma família humilde na roça, filha do meio de 10 irmãos, sete vivos provou muito cedo a responsabilidade da maternidade ao cuidar de pelo menos 3 irmãs mais novas. A disciplina e os cuidados que se impôs durante anos foram essenciais para a manutenção da sua vida e de seus familiares. Viveu esta lei e assumiu esta moral em cada instante de sua vida. Cresceu, progrediu e se formou enfermeira zelando pela limpeza e perfeição nos procedimentos que realizava. Este aprendizado não ganhou na universidade, mas nas divisões de tarefas e comida que executou com liderança em sua infância pobre. Preocupava-se consigo e com os quais compartilhava seu amor:

– Fico nervosa com minhas irmãs quando saem de casa, essa violência toda aí nas ruas, só durmo depois que elas chegam das festas…

Ansiedade marcada pelo que ia acontecer sempre ganhava uma conotação emergencial, desnudando o seu medo de morte. Pavor de ser enterrada viva, Dona Juraci, dona da verdade alcançou seu objetivo e sobreviveu. Brincava dizendo:

– “Eu faço o que eu quisé…”

Foi quando lembrei-me de uma frase, “cuidado como o que você deseja, que você pode conseguir…” Esta frase implica uma sabedoria ancestral arraigada nos mitos gregos e romanos. Assim como na história do deus Dionísio que ao atender ao pedido de um homem que queria ser rico, dotou-o de um dom: tudo que tocasse viraria ouro. Ou mesmo o dom que Apolo deu a Cassandra, o da visão profética… Ambos se tornaram vítimas de suas próprias qualidades, o primeiro, sem conseguir comer e beber pois todo alimento que colocava na boca transformava-se em ouro e Cassandra que só dizia a verdade e por isso foi considerada louca por seus concidadãos troianos… Assim como a Dona Juraci exercitava a verdade da vida, verdade essa muito difícil de ser enxergada por outros… Cegava-os diante da luz intensa que emana da pureza da matéria bruta, a realidade.

Para vencermos essa realidade desenvolvemos habilidades que são como ferramentas potentes, mas que podem ter mal uso. Na verdade o potencial da doença existe em todos os dons e não é porque temos uma habilidade que temos de experimenta-la obsessivamente (repetidamente), vividos de forma unilateral sem compartilhar, aprendendo, ensinando e monoteisticamente, como se fosse esta a única verdade, a verdade suprema, adorando-a acima de todas as outras coisas ou pessoas… Pois desta forma estaremos rompendo com o equilíbrio necessário a própria vida, dilacerando a própria saúde.

A estrada do exagero, às vezes leva ao palácio da sabedoria e foi assim, aprendendo com a própria dor que Dona Juraci começou a se descuidar ou melhor cuidar-se. Engravidou, até meio fora de época, dessas que parecem desorganizar, um recado da própria vida… Linda… A beleza daquela menina suscitou-a a imaginar um futuro melhor, melhores idéias e projetos, de pensamento em pensamento foi construindo uma vida melhor. Deu o nome a menina de Rosa, e viu-se curada quando percebeu que sonhar era mais importante que viver…

Poder: correção; desejo: viver, sonhar; medicamento: Arsênicum album.

Elemento básico, Natrum muriaticum

Estava deprimido, triste e melancólico. Era 10 h da manhã… De um lado o deserto do outro o mar. Minha boca estava seca, salgada e com rachaduras nos cantos. Meus calos e calcanhares cortados, meu corpo magro e fatigado eram o retrato daquele amor perdido que tanto castigara meu coração que agora palpitava como se quisesse sobreviver. Confortava-me com a solidão e a dor latente na cabeça como se mil martelos pequenos me golpeassem, debruçavam – me sobre meu corpo. Quando estava quase tocando o chão com a minha testa pude vislumbrar um ponto brilhante. Minha vista fraca, olhos irritados e rochos permitiram – me ainda focar o objeto e como num suspiro antes mesmo de desmaiar consegui me esticar, pegar a pedra e curiosamente coloca – la na boca e experimentar.

Ao acordar já era noite e o gosto de sal deixado pela pedrinha entre minha saliva, recordou – me aquele último movimento antes de perder os sentidos. Aos poucos minha mente acordava e com ela algumas repostas surgiam. Costumava perguntar:

Por que as coisas não davam certo para mim?

Cheguei a fazer até um curso de Marketing, e me convenci que a saída era os cinco P: preço, prazo, praça, produto e prestígio, mas:

– “Puts q’uil paril” o sexto e sétimo“P”, sempre me atrapalhava e era “prejuízo” na certa.

– Paiê… Socorro!, Na tentativa de que o nono “P” me ajudasse, gritei… Foi quando ouvi uma vós lá do fundo conversando comigo:

– O que você procurava?

– Ah! Eu queria ser feliz, alegre, ter um monte de amigos e alguém que me amasse de verdade…

– E porque você sempre procurou isto no claustro, na intemperança, sem saborear o pouco que podia conter uma mastigação?

– Como assim?

– Se abster de conviver, de riscos e da dor, é não experimentar a própria vida. Se isolar é sucumbir ao poder do silêncio é tentar modificar pela ausência, pela dor que sua falta pode causar ao outro, mas que acaba por arrastar você mesmo… Olhava para você morrendo de sede ao lado dessa imensidão de água.

– Mas não podia beber era água salgada…

– Por isso não és feliz… o que tinhas em mãos não era água mais sal…

– Quer dizer então que foi você que me salvou?

– Tinhas milhões de pedrinhas ao seu redor capaz de reorganizar todos os seus fluidos, mas querias outro… “Proibidos a sua natureza”… Foi apenas naquele instante em que nada mais podias pensar, que libertastes sua mente, que eu pude lhe aconselhar a um primeiro gesto… O de colocar o sal sob sua alma…

– Como assim primeiro gesto?

– Gesto é um movimento que se realiza para elevação da alma, e até aquele momento você só queria morrer, paralisar…

– Obrigado Senhor por me salvar!

– Engano seu, não sou um “Senhor”, sou a vida e esta não salva ninguém, apenas lhe dá a semente (o sal), para que você possa plantar… reorganizar-se e construir sua felicidade…

Poder: claustro; desejo: contato; medicamento: Natrum muriaticum.

A cética, o ovo e a galinha… Pulsatilla

Como é que a senhora está Dona Clotilde?

– Bem …

Tomou a medicação?

– Tomei.

E a senhora acha que lhe ajudou a se livrar da estafa?

– Estou mais calma, mas outras coisas aconteceram também…

Que coisas?

– Ahh… Saí de férias, as crianças foram para a casa dos avós e eu e meu marido pudemos passear um pouco… não sei se foi o remédio… mas estou melhor.

É comum nos fazer uma pergunta atrás da outra, para encontrar explicações para determinado fato… E ao tentarmos encontrar aquela explicação que seria a gênese de todo o processo que gerou aquele fato, sempre nos deparamos com a mesma pergunta… O que veio primeiro, o ovo ou a galinha? Isto é um paradigma e só podemos resolver este axioma respondendo: – O ovo e a galinha, ao mesmo tempo. E da mesma forma respondemos a Dona Clotilde:

– A cura vem de várias formas e ao mesmo tempo, somos como um satélite que ao mudar de posição vislumbra um mundo outrora desconhecido que morava ao lado. O eixo de sua vida mudou de direção e o mal moral que lhe envolvia quebrou, permitindo desabrochar o botão que outrora encistado, morria adequada e silenciosamente.

… em outras palavras,

Na verdade, mesmo de férias e sem as crianças que certamente eram responsáveis por extremo cansaço e estresse, poderia ter sofrido pela falta que a necessidade de cuidar lhe obrigava… O marido poderia ter ficado mais no seu pé, pois também estava sem seu vício – o trabalho… e por fim a escassez comum de dinheiro poderia ter impedido o passeio. Passear, é movimento e alimentar – se de vida, do belo, é estar em companhia agradável, exercitar seus desejos sem as influências do poder perverso do ter que… é encontrar a paz, que profundamente inserida em todos nós, resiste aos dogmas morais cuja confusão estabelece que: gente é produto, amar é submeter – se e mercado é vida.

Poder: abandono; desejo: de atenção; medicamento: Pulsatilla

Por quê?

Ela chegou e disse:

– O que é que tem nesses vidrinhos aí?

Por quê? Interpelei, como se já não soubesse…

– Dr… Mudei minha mesa de lugar no escritório, pedi minha separação pro meu marido, briguei com minha mãe e estou encarando umas baladas…

E o sono…

– Estou dormindo que uma beleza!

Emagreceu?

– Perdi 1,5 kg sem fazer muito esforço, tenho conseguido ficar um pouco mais distante dos doces!!!

Sexo.

– Conheci um cara…

Medos…

– Chorar agora só com hora marcada, não estou mais me sentindo tão só.

São histórias como essa, vivendo cotidianamente, que me encorajou a fazer este livro.

A história acima aconteceu no meu consultório e mostra uma ex-paciente assumindo o controle de seu corpo, de suas emoções, de sua vida, o seu mundo e não um desvio da moral familiar dos “bons” costumes. O caminho para a cura.

Durante dez anos pesquisei e compilei cenários em que almas e corpos se entrelaçam na busca de um equilíbrio tentando diminuir angústias, tensões e dores.

Vou descrever situações em que almas em conflito geram doenças. Almas que se chocam dentro de casa e nos escritórios pelo poder que imobiliza, afasta e corrompe os organismos. Este livro vai lhe ajudar a se ver de fora. E as histórias que reproduzo sustentam e geram outro poder, o de decidirem sobre suas próprias vidas, que sugeri com bons resultados ao longo dos últimos dez anos.

Você acompanhará também almas solitárias buscando se vincular ao universo de outras almas fora do seu contexto imediato. Por querer mais poesia, mais arte, mais alegria ou mais amor. Um esforço solitário que quando bem sucedido vira sucesso. Quando as tentativas falham, vira hipertensão, depressão, obesidade e medo.

A cura começa ao identificarmos como as relações entre gente, entre conceitos conflitantes com desejos, geram um poder perverso que acabam por se encistar o corpo das pessoas. Num lugar vazio, que nada floresce, o Eu só. Que cresce esmagado, como um nódulo que nos incomoda e acaba virando doença.

O Instituto de Valorização da Saúde estuda o homem sob a ótica dos desejos, das relações entre almas e poder. Tenta mobilizar a integridade da pessoa (corpo e alma) a seu favor. Mobilizar o ser vivo a favor de sua própria saúde, aprendendo a gerenciar conflitos, tensões e angústias para evitar doenças.

Vou mostrar também que é muito mais difícil buscar a Saúde do que sugerir panacéias para as doenças catalogadas.

A Saúde ou a cura (ou seja o retorno à Saúde) na maioria das vezes está ao nosso alcance. Este livro e o Instituto de Valorização da Saúde pretende ser o seu apoio nesta conquista.

O mundo virtual

“A folha toma a forma específica do carvalho, do bordo ou da bétula de folhas serrilhadas porque algo no vazio circundante governa o modo de ela se formar de acordo com sua espécie”- Goethe. Nem tudo é genético ou a genética não governa tudo, mas atua de forma interativa com o meio. E o meio é o vazio, o espaço entre um e outro indivíduo, que só existe quando através das relações se percebe a distância ou proximidade que nos encontramos uns dos outros. É na análise deste universo quântico que começaremos a desvendar o invisível. Nos utilizaremos de diferentes modelos, o valor destes modelos está em estabelecer uma definição, um padrão útil para medir aproximações. Nos valeremos dos arquétipos, modelos, que há 200 anos frutos de experimentações médicas, delinearam os chamados policrestos homeopáticos. Exploraremos as relações ancestrais que os dois maiores pecados morais: ira e luxúria, traduzidos sutilmente por Jung e Freud como poder e desejo interferem na saúde organizacional. É claro que o mundo virtual é bem mais amplo e fazem parte deste, também aspectos ambientais como: poluição do ar, sonora, visual, alimentos impregnados de metais e significativa carga hormonal, ondas eletromagnéticas dentre outros. Porém não sentimos, que estes elementos sejam tão relevantes nos processos patológicos endêmicos atualmente registrados: obesidade, ansiedade, depressão e criminalidade.

No excepcional livro de James Hillman, Tipos de Poder, que define poder como ser capaz, pura potência, não o fazer mas a capacidade de fazer, a energia oculta capaz de desempenhar um trabalho ou mudança. O desejo, muitas vezes representado como impulso sexual, na verdade é o estopim, a centelha que deflagra o poder como instrumento para a aquisição de um bem. Entender desejos passa pelo entendimento dos códigos de cada indivíduo, o que dá ou não prazer para cada um. Entender poder passa pelo entendimento dos códigos sociais do que é bom ou ruim – sucesso ou fracasso. Ambos têm obviamente conexões intrínsecas indivisíveis, mas podemos separá – los para melhor explicitação dá técnica. O poder exercido sobre um indivíduo, advindos dele próprio ou de outrem, poderá cura – lo ou adoece – lo, mas se perpetuado por longo período de tempo, mesmo que o considere como “favorável” levando – o a “ganhos” de qualquer natureza, irá adoece – lo. Assim são os miasmas, como uma crosta endurecida pela poeira que só o tempo é capaz de sobrepor e diferentemente de doença age como uma força que nos mantém encistados, impedindo de germinar. Em outras palavras as sementes são os nossos desejos e o poder, esta força que quando perversamente exercida sobre nós, detém nossos pensamentos, fantasias, sentimentos e hábitos num patamar inferior, de sofrimento.