Risco X Impacto e a Gincana Escolar

Como avaliar se medidas de governo são efetivamente responsáveis pelo desenvolvimento das pessoas? Se diminuem ou aumentam o acesso? Como decidir pelo investimento? Qual a diferença entre risco e impacto de uma ação?

De forma similar pudemos identificar esses problemas na gincana proposta pela Dona Noca, diretora da escola das Matrizes, no verão passado, cuja pretensão era melhorar o desempenho dos alunos submetendo-os a um difícil concurso no qual a escola seria classificada dentro de um ranking de qualidade internacional.

A competição resumia no seguinte: os estudantes deveriam escolher 2 propostas que melhorassem o desempenho escolar. Executadas, aquela que desse melhor resultado seria implantada definitivamente pela direção da escola.

Eleitas as propostas! A de Hugo consistia em melhorar a cantina colocando ar condicionado e um projetor de filmes 3D para os estudantes. Guilherme propôs  reformar a biblioteca dando acesso irrestrito a todas as bases de dados do mundo. Para a avaliação das mesmas antes da consolidação final da proposta vencedora, firmaram-se contratos temporários com uma casa de entretenimento e com a biblioteca nacional que também era próxima da escola. Os resultados seriam aferidos pelas notas nas provas, associando cada grupo de alunos com desempenho A ou B. Os que escolheram o projeto do Guilherme, a biblioteca, não podiam freqüentaram o projeto do Hugo na cantina e vice versa. O desempenho A correspondia as notas acima de 7 e o resultado B de 5 e 7 pontos, as notas abaixo de 5 não foram computadas. O colégio rachou! Contato zero, entre os grupos até o término da avaliação com a exposição dos resultados:

  Desempenho A Desempenho B
Projeto Guilherme 30 669
Projeto Hugo 10 413

A tabela acima de cara sinalizou que havia mais alunos com resultado A e B no grupo da biblioteca que no grupo da cantina. Isto só sinalizava a fragilidade do projeto do Hugo em relação ao do Guilherme, uma vez que ambos os desempenhos foram menores para este projeto. Isto nos parecia lógico uma vez que os problemas pedagógicos daquela escola de classe média alta do Paraná não se encontravam num verão escaldante, menos ainda na falta conhecimento que programas em 3D pudessem acrescentar. A discussão entre os alunos foi elevada e as acusações não faltaram… O projeto G não privilegia a qualidade de vida dos estudantes! O Guilherme é gay!? Lugar de gordo é na cantina…

Pacificado os ânimos, Dona Noca calculou o risco relativo. Mas o que é o risco? É uma medida de força associação (hierarquia primeira nos critérios de Hill sobre causalidade – texto Jesinho e a limonada suíça) usada para julgar se uma associação pode ser chamada de causal. Estima a magnitude desta associação.

O projeto do Guilherme aquele com plausibilidade obteve um força na associação, um risco, bem maior para desempenho A (30/10 = 3) do que para o desempenho B (669/413 = 1.60). Lembremo-nos que o desempenho A é aquele que interessava a diretora para o concurso internacional.

Isto significa dizer que deveríamos investir no projeto do Guilherme? Afinal assinaturas com todas as bibliotecas do mundo custam uma “grana preta” e para tal deveríamos ter certeza de que isso teria um impacto relevante. No mínimo que atingisse os objetivos propostos pela escola. O impacto, uma vez assumida que a associação é forte, ou seja, uma das causas significativas do efeito – desempenho A, reflete o número de estudantes, que podem ter o melhor desempenho com esta iniciativa. Ou seja, (30-10) 20 estudantes com desempenho A, contra (669-413) 256 com desempenho B poderiam ser beneficiados. O fato que tal medida beneficiaria muito mais estudantes com desempenho B que com A, não aproximava o projeto do objetivo da diretora. Apesar de uma melhora de 200% (R=3) no desempenho A contra 60% (R=1.6) do desempenho B, em relação ao projeto da cantina, o impacto sobre 20 alunos apenas, não atingiria a meta necessária para obtenção do certificado internacional, definido em 40% mínimo dos alunos com desempenho A. Sim, toda a escola teria de participar do concurso. Estes 20 alunos não representavam 1% do total de alunos da escola. Mesmo que o projeto da biblioteca tenha de fato elevado o número de alunos com desempenho B e este impacto, 256 alunos, ser bem mais significativo, isto não classificaria bem a escola aos olhos do certificado internacional.

É óbvio que os protestos se intensificaram, agora os partidários do Hugo e do Guilherme se juntaram e exigiram da diretora Noca o investimento na biblioteca. Os pais de alunos ameaçaram retira-los da escola. A diretora cedeu… A escola foi rebaixada na avaliação internacional. Em um ano com o estigma da desclassificação, perdeu alunos, teve que dobrar a mensalidade para manter os serviços, perdendo mais alunos… Ao final de 2 anos a escola das matrizes foi comprada por sua concorrente o colégio João de Barro, cujo diretor foi logo dizendo: Gincanas são proibidas pela instituição!